A Rua 8, no Centro de Goiânia, foi, há alguns anos, resgatada da irrelevância pela cena do rock alternativo da capital. Uma rua que antes era vazia, escura e perigosa durante a noite, se transformou em um espaço cheio de gente e de vida. O Zé Latinhas, símbolo da botecagem goianiense, voltou a ficar lotado, e o Cine Ritz, último cinema de rua da cidade, passou a atrair filas que se estendem pela calçada. Em 2025, a efervescência da Rua 8 reflete o espírito de “fazer acontecer” que permeia o meio alternativo da cidade. De forma autossuficiente, a cena cultural reclama espaços de resistência em Goiânia.
No último dia 24 de janeiro, a Rua 8 foi palco de mais um momento histórico: a exibição de Goiânia Rock City, documentário dirigido por Théo Farah que registra quase três décadas da cena alternativa da capital, dos anos 1990 aos anos 2010. Para quem testemunhou essa história, a estreia foi como reencontrar velhos amigos. Nomes emblemáticos da música goianiense se reuniram na calçada do Ritz, passando quase despercebidos aos olhos desatentos dos "não iniciados": Maurício Mota, da Hang the Superstars; Fal e Leozinho, da Rollin’ Chamas; Totonho, dos Obesos HC; Diogo e Rodrigo, da Hellbenders; Victor Rocha e Douglas de Castro, da Black Drawing Chalks; além do jornalista e produtor Pablo Kossa e do “paizão” da cena, o produtor cultural Carlos Brandão, entre tantos outros.
“Nem nas minhas expectativas mais ousadas eu achei que ia dar metade [dessa audiência]”, me confidenciou Farah antes da sessão, modesto. Mas era impossível ignorar o burburinho ao redor: a Rua 8 fervia, e esse calor era um reflexo direto da história contada no filme.
E como a própria cena, o filme possui uma abordagem pragmática para contar essa história:de reflexões pessoais do diretor ou longas sequências nostálgicas em preto e branco. A pegada é quase jornalística: talking heads intercalados com poucos cards de título e outras animações. Sem preâmbulos, a narrativa se constrói pelas palavras dos 27 entrevistados. Mas como contando ninguém acredita, as narrações são incrementadas com vídeos, fotos e outros registros da época.
O que pode faltar em aprimoramento estético, portanto, é tranquilamente recompensado em informação. Se isso é bom ou ruim, vai do gosto do freguês, mas me agradou o pragmatismo cruzão da produção, feita de forma independente, com pouca grana e com uma equipe pequena.
O ponto alto do documentário é, sem dúvida, a homenagem ao papel de Carlos Brandão. Sob sua gestão nos anos 2000, o Centro Cultural Martim Cererê se tornou o epicentro da cena alternativa em Goiânia, uma verdadeira Meca cultural de fácil acesso. Após seus depoimentos, o cinema explodiu em aplausos e assobios, um reconhecimento merecido tanto para Brandão quanto para o Martim Cererê, que permanece no coração dos roqueiros goianienses.
Se você viveu essa cena e quer relembrar, ou se faz parte da nova geração e deseja conhecer essa história, uma nova oportunidade está a caminho. Devido à alta procura por ingressos na estreia, o diretor já organiza novas exibições no Cine Cultura, que será reinaugurado nesta segunda-feira (27). As datas serão divulgadas pelo Instagram de Goiânia Rock City.