O alarme do lixão de Goiânia soou em 2011, quando caducou a licença ambiental para funcionar, mas foi a tragédia ambiental do lixão de Padre Bernardo, em junho, que acendeu todas as luzes sobre o problema existente também na capital.
De 2011 para cá, o Ministério Público do Estado de Goiás tem atuado sistematicamente. Em 2014, entrou com ação na justiça questionando a falta do licenciamento ambiental do lixão e só em 2020 conseguiu um acordo com a prefeitura da capital, que assinou um Termo de Ajustamento de Conduta, TAC, e se comprometeu a regularizar o funcionamento do lixão.
Mas o que se viu foi o descaso total da prefeitura, que deveria ter transportado os rejeitos para aterros sanitários próximos da capital, desativado o atual lixão e tomado medidas para a recuperação ambiental da área, até agosto de 2024. Nada disso foi feito.
Muito pelo contrário. Um relatório da equipe técnica da Secretaria do Meio Ambiente e de Desenvolvimento Sustentável do Estado de Goiás, SEMAD, apontou que o lixão de Goiânia recebe uma quantidade de resíduos duas vezes e meia acima de sua capacidade, o que leva a instabilidade do maciço e risco de desabamento, além da incapacidade de dar o tratamento adequado aos rejeitos.
O lixão está em área urbanizada, a apenas 300 metros de distância de residências, e expõe os moradores ao mau cheiro. Como está descoberto, aumenta a infiltração das águas das chuvas, e fica exposto ao contato com animais, que são vetores de doenças para a população.
O Aeródromo Nacional de Aviação está a 2 km do lixão e sob risco constante de acidentes, por ser um local de atração de pássaros. A Área de Segurança Aeroportuária, ASA, determina um raio de distância de pelo menos 13 km para operação segura.
O córrego Caveirinha margeia o lixão e pode ser contaminado pela infiltração de chorume no solo, que não dispõe de um sistema eficiente de drenagem, fora o perigo de ruptura das lagoas de contenção. A menos de 900 metros dali, produtores locais dependem da água do córrego para irrigação de hortaliças.
Poderíamos ficar aqui horas e horas descrevendo as irregularidades e riscos oferecidos pelo lixão de Goiânia, que levaram a justiça a determinar seu fechamento gradual, em abril, por descumprimento da TAC e falta de licenciamento. A prefeitura recorreu e conseguiu reverter a decisão da justiça.
No entanto, a SEMAD passou a aplicar multas diárias de 10 mil reais contra a prefeitura e constatou que a situação do lixão é irreversível. Já o Ministério Público de Goiás não admite mais prorrogação de prazos, porque não se pode negociar práticas de crimes ambientais.
Parece que estamos assistindo a um mesmo filme. Quanto tempo mais será necessário até que ocorra uma tragédia semelhante a do lixão de Padre Bernardo?
Neste momento, estamos apenas apagando incêndios. Mas a existência dos lixões irregulares e mesmo a dos aterros sanitários, que atuam dentro das normas técnicas, precisam nos levar a questionamentos sobre a nossa forma de consumir e o lixo que geramos a partir de um consumo desenfreado, que satisfaz desejos e não a reais necessidades.
A saúde do planeta não coexiste com a sociedade de consumo. Precisamos repensar e redefinir a forma como atuamos no mundo.